Roberto de Pinho

As Coisas: espirais


Quero fazer uma poesia que ande em círculos
mas que não seja repetitiva

Quero fazer uma poesia 100% original
mas que seja uma homenagem ao que já foi feito

Quero fazer uma poesia que vá cada vez mais alto
mas que nunca se perca

Eu vou fazer uma canção de amor

Posted by Roberto de Pinho in AsCoisas, Verso e Prosa, 5 comments

Vagar: 2 anos, em 1999

Vi uma chamada para uma reportagem sobre o caminho de Santiago e fiquei pensando:

O que pode haver em um caminho que o permita transformar as pessoas ?

Quando Colombo deixou o porto de Palos e chegou ao novo mundo, sacramentou a impossibilidade do ser humano ir a qualquer parte por si só.

Ao juntar o mundo, Colombo quebrou a sua continuidade. Definiu Velho e Novo Mundos. Dois em um único planeta. Para atravessar de um mundo a outro eram, e pode-se dizer que ainda são necessárias imensas naus, ou naves, como queiram.

Quando entramos nessas naus, carros, aviões, entre outras, sumimos num ponto e aparecemos em outro sem entender o ser um só, sendo vários. Perdemos parte importante do processo.

Assim, um caminho é capaz de juntar novamento o mundo, torná-lo uno. Mostrar-nos que o mundo de Santo Amaro é o mesmo que o mundo de Conceição da Feira, o mundo do Catete é o mesmo que o mundo de Ipanema, que o mundo de França é o mesmo que o mundo de Espanha.

Este é o valor de Amir Klink remar o oceano. Costurando novamente Velho Mundo e Novo Mundo.

Este é o valor do Vagar, que reconstroi o único meio de transporte não nave, o único meio de transporte que não permite a alienação do caminho, cujo o meio é tão fim quanto a chegada : O Andar.

Mas nem só de meios vivem os fins. Quem Vaga desloca-se ou apenas movimenta-se. E para deslocar-se é necessário movimento e fim.

Originalmente publicado em 07/08/1999 19:06, Aqui.

Posted by Roberto de Pinho in Favoritos, Verso e Prosa, 2 comments

TEDTalks: Rives

Tenho pensado, e relutado, um pouco sobre postar vídeos aqui no blog. Ainda acho que o texto tem uma relação mais democrático com o leitor. Exige a sua participação, ao mesmo tempo que permite que, num passar de olhos, ele possa decidir engajar-se ou não na leitura efetiva da coisa.

Mas este videozinho (tem apenas 3 minutos) é ótimo para falar do TED Talks, uma excelente dica de Camilo. Também é mais próximo da temática deste blog, enquanto as demais apresentações são um pouco mais tecnológicas. Confiram.

Three minutes of fast-paced, whip-smart wordsmithing from spoken-word artist Rives, who has some unconventional ideas about how the Internet should be run. By turn provocative, touching and flat-out hilarious, Rives is one of the most original talents on the spoken-word scene. He’s a gutsy poet who constantly pushes the limits of the genre: striving to reinvent the form, and find new contexts to make poetry relevant. Rives originally trained as an engineer, and he writes pop-up books for children on the side. (Recorded November 2006 in New York, NY. Duration: 4:15)

Posted by Roberto de Pinho in Favoritos, Verso e Prosa, 0 comments

Outras Coisas: Pintura Moderna como um Símbolo

Nosso ponto de partida é o fato psicológico de que o artista sempre foi o instrumento e o interprete do espírito de sua época. Em termos de psicologia pessoal, sua obra só pode ser parcialmente compreendia. Consciente ou inconscientemente, o artista dá forma a natureza e aos valores da sua época que, por sua vez, são responsáveis pela sua formação.

O artista moderno muitas vezes reconhece, ele próprio, a inter-relação entre sua obra de arte e a sua época. Assim escreve a respeito o crítico e pintor francês Jean Bazaine em suas Notas sobre pintura contemporânea: “Ninguém pinta como quer. Tudo que o pintor pode fazer é querer com todas as suas forças, a pintura que sua época é capaz.” E declara o artista alemão Franz Marc, morto na 1º Grande Guerra: “Os grandes artistas não buscam suas formas nas brumas do passado, mas sondam tão profundamente quanto podem o centro de gravidade recôndito e autêntico da sua época.” E, já em 1911, Kandinsky escrevia em seu famoso ensaio A Propósito do Espiritual em Arte: “Cada época recebe sua própria dose de liberdade artística, e nem mesmo o mais criador dos gênios consegue transpor as fronteiras desta liberdade.

Os artistas, como os alquimistas, provavelmente não se deram conta do fato psicológico que estavam projetando parte da sua psique sobre a matéria ou sobre objetos inanimados. Daí a “misteriosa animação” que se apossa destas coisas e o grande valor que se atribui até mesmo aos detritos. Os artistas projetavam suas próprias trevas, sua sombra terrestre, um conteúdo psíquico que tanto eles quanto sua época haviam perdido e abandonado.

Franz Marc disse um dia: “A arte do futuro dará expressão formal às nossas convicções científicas.” Foi uma afirmação profética. Já observamos a influência que exerceram sobre os artistas, nos primeiros anos do século XX, a psicanálise de Freud e a descoberta (ou redescoberta) do inconsciente. Outro ponto importante foi a relação entre a arte moderna e os resultados obtidos na pesquisa nuclear.

Em termos simples, não científicos, a física nuclear despojou as unidades básicas da matéria do seu caráter absolutamente concreto. Tornou a matéria misteriosa. Paradoxalmente, massa e energia, onda e partícula provaram sua permutabilidade. As leis de causa e efeito mostraram-se válidas apenas até certo ponto. Já pouco importa que todas as relatividades, descontinuidades e paradoxos só se apliquem aos limites extremos do nosso mundo, o infinitamente pequeno (o átomo) e o infinitamente grande (o cosmos). Provocaram uma mudança drásticas no conceito de realidade, pois uma realidade nova, e irracional e totalmente diferente, surgiu por trás da realidade do nosso mundo “natural”, regido pelas leis da física clássica.


Só alguns poucos artistas tomaram consciência da relação existente entre sua forma de expressão e a física e a psicologia. Kandinsky é um dos mestres que expressou a profunda emoção que lhe despertaram as primeiras descobertas da física moderna. “No meu espírito, o colapso do átomo foi o colapso de todo um mundo: de repente tombaram as minhas mais firmas muralhas. Tudo se tornou instável, inseguro e sem substancia.

Esta ruptura com o mundo das coisas aconteceu mais ou menos ao mesmo tempo com outros artistas. Escreve Franz Marc: “Não aprendemos, depois de milhares de anos de experiências, que as coisas falam cada vez menos quando lhes damos a precisão ótica de um espelho? A aparência será eternamente pobre de relevos…?

Para Marc, o objetivo da arte era “revelar a vida sobrenatural que existe por detrás de tudo, quebrar o espelho da vida para que se possa contemplar o verdadeiro rosto do ser”. E escreve Paul Klee: “O artista não atribui às formas naturais do universo aparente a mesma significação convincente dos realistas que o criticam. Ele não se sente intimamente ligado a esta realidade porque não consegue ver nos produtos formais da natureza a essência do processo criador. Está mais interessado nas forças formativas do que nas formas que estas forças produzem.Pietr Mondrian acusou o cubismo de não ter perseguido a abstração até sua conclusão lógica, “a expressão da realidade pura”. Isto só se consegue com a “criação da forma pura”, livre de sentimentos e idéias subjetivas. “Por detrás das mudanças das formas naturais existe a realidade pura, que não muda jamais.

Um grande numero de artistas tentou passar das aparências à realidade de um segundo plano, ou ao “espírito da matéria”, por um processo de transmutação dos objetos – através da fantasia, do surrealismo, das imagens oníricas, do acaso etc. Os artistas “abstratos”, no entanto, voltam as costas aos objetos. Seus quadros não continham objetos identificáveis, eram segundo expressão de Mondrian, nada mais que “pura forma”.

Nenhum artista sentiu esse segundo plano místico da arte mais agudamente ou falou a seu respeito com paixão mais intensa do que Kandinsky. A importância das grandes obras de arte de todos os tempos não repousa, a seu ver, “na superfície, no exterior, mas na raiz das raízes – no conteúdo místico da arte”. E por isto afirma: “O olho do artista deveria estar sempre voltado para sua vida íntima, e seu ouvido sempre alerta à voz da necessidade interior. É o único meio para dar expressão ao que a visão mística comanda.

Kandinsky descrevia seus quadros como uma expressão espiritual dos cosmos, uma musica das esferas, uma harmonia de cores e formas. “A forma, mesmo quando abstrata e geométrica, tem uma ressonância interior; é um ser espiritual cujas qualidades coincidem exatamente com aquela forma.” “O impacto do ângulo agudo de um triangulo com um circulo tem um efeito tão surpreendente quanto o dedo de Deus tocando o dedo de Adão, em Michelangelo.

Em 1914, Franz Marc escreveu em seus Aforismos: “A matéria é um assunto que o homem consegue, no máximo, tolerar; ele se recusa a reconhecê-la. A contemplação do mundo tornou-se a penetração do mundo. Não existe místico que, nos seus momentos de êxtase mais sublime, jamais alcance a abstração perfeita do pensamento moderno, ou que ausculte as suas ressonâncias com sonda mais profunda.

Paul Klee, que podemos considerar o poeta dos pintores modernos, diz: “É missão do artista penetrar o mais fundo possível naquele âmago secreto onde uma lei primitiva sustenta o seu crescimento. Que artista não desejaria habitar a fonte central de todo movimento espaço-tempo (esteja ele situado no cérebro ou no coração da criação), de onde todas as funções extraem a sua seiva vital? Onde se esconde a chave secreta de todas as coisas ? No ventre da natureza, na fonte original de toda a criação?… Coração a palpitar, somos levados cada vez mais apara baixo, em direção a fonte primeira.” E o que encontramos nesta jornada “deve ser levado muito a serio, desde que , combinado integralmente com os meios artísticos apropriados, desabroche em estrutura”. Porque, como acrescenta Klee, não é apenas questão de reproduzir o que se vê, mas de “tornar visível tudo o que se percebe secretamente”. Toda obra de Klee se inspira e se fixa diretamente nesta fonte original das formas. “Minha mão é, inteira, o instrumento de uma esfera distante. E também pouco é minha mente que age; é alguma outra coisa”.

Trechos do Livro O homem e seus símbolos, por Carl G. Jung
Texto de Aniela Jaffé

Fotos de Izolag
Indicação do texto e fotos, Ananda

Posted by Roberto de Pinho in AsCoisas, Verso e Prosa, 5 comments

Outras coisas: Metalinguagem

Seu texto veio a calhar justamente como o tipo de coisa que eu estava querendo ler. Curto, arte, sólido. Lembrei das coisas que eu escrevia. Me perguntei se você escrevia da mesma maneira. Lembro que as vezes escrevia verborragicamente. À medida que fui envelhecendo, perdi a naturalidade e escrevia com muito mais trabalho que inspiração. Escrevia algo raciocinando, procurando dizer com menos palavras. Pensei que talvez você tivesse escrito duas ou três frases e, pensando melhor, teria reduzido em apenas uma. E, satisfeito, desligou o monitor e foi dormir. (me refiro à última frase, que realmente me absorveu – a satisfação de uma frase bem escrita sempre me é muito fisiológica)


Fiquei imaginando há quanto tempo havia escrito aquilo, em que momento da vida. Se tinha observado, ou passado por aquilo.Alguém que lhe viu, ou você como um terceiro olho? Como, o quê, quando…? De quem, aquele olhar ? É uma cena, estou certa de que aquilo partiu de uma cena que você observou. E daria tudo para agarrar essa cena, como quando eu via fotos de gente que havia morrido há pouco tempo e ficava tentando agarrar o exato momento em que aqueles sorrisos das fotos se fecharam em azul. Tento pegar, como se corresse para salvar a vida de uma pessoa num sonho, correndo ao lado de uma cachoeira, somente para descobrir, ao acordar, que procuro salvar minha própria vida – e não consigo.

Fiquei encantada que haja alguém com essa sensibilidade tão perto de mim. Suspirei aliviada por dois segundos. É o tipo de coisas que eu escreveria e ninguém nunca entenderia, estou certa disso.Entao, eis que alguém se adianta, não só entende, como escreve antes de mim! Ufa.

beijos,

Sissi Blue


Posted by Roberto de Pinho in AsCoisas, Verso e Prosa, 3 comments

A importância do sagrado

Quase nada para mim é sagrado: esporte, política, religião, gosto musical e por a vai.

Isto aumenta em muito o risco que corro e incorro de ofender aqueles que guardam algum respeito ao que lhe é caro.

Para variar um pouco, estive do outro lado do muro no show de Stanley Jordan, praguejando aqueles que insistiam em ficar falando durante o show. Fiz uma mental note para nunca mais ficar contando piadas durante missas…

No dia a dia, alguns hábitos sagrados podem ser estorvo, mas podem ser muito úteis, como o hábito (arcaico, em tempos digitais) de transferir telefones para a agenda nova no final de ano.


Dentre os meus poucos hábitos sagrados, nada supera em santidade este mandamento:

Não deixarás o cinema antes do fim do filme.


Só o desobedeci 2 vezes, uma assistindo, de novo, História Sem Fim 2. Saí depois que a mocinha, a que estava ao meu lado, não a do filme, não correspondeu às minhas investidas.

A segunda, num Almodóvar, mas desta vez, o pecado valeu a pena, e olhe que era um Almodóvar.

Posted by Roberto de Pinho in Verso e Prosa, 4 comments

Recesso !!!


Quem faz mestrado, doutorado etc não tem como não se identificar com estes PhD Comics

Posted by Roberto de Pinho in AVida, 2 comments

Metalinguagem

Existe uma cegueira das coisas que eu sei. Por mais que tentemos, não conseguimos deixar de enxergar aquilo que já sabemos. Isto se apresenta como problema prático quando estou dando aula ou fazendo uma apresentação: como é que a aula ou apresentação é vista por aqueles que não conhecem do assunto ?

Às vezes a questão é trivial e para assunto mais cartesianos, é possível até desenvolver uma certa prática, acredito eu. Mas nem sempre é assim. Nos textos As coisas: olhar outro e As Coisas: Caminhos sou totalmente incapaz de perceber como é a percepção daquele que os lê sem tê-los escrito. Se é que esta percepção é única, e ela não é.

Para explicar um assunto, como loops infinitos, por exemplo, posso recorrer à minha memória do tempo em que não sabia o que era isto, e fazer o caminho reverso neste meu aprendizado, tentando coletar ao longo do caminho quais a informações foram úteis para fazer as conexões que me levaram a compreender o conceito em questão.

Mas para os dois textos citados, não existe um tempo em que eu não os conhecia. Eles surgiram segundo uma lei de formação, de um algoritmo, de um idéia que eu mesmo segui. Não posso olhá-los sem saber que lei é esta. Eu a escolhi, ela esta lá, me salta aos olhos. Por vezes acho que ela é evidente a todos os leitores, por vezes acredito que a sua descoberta é impossível. Os textos foram escritos um após o outro, durante uma aula em que a didática a tornava menos útil que a solitária leitura do hermético assunto num livro. Por pior que fosse.

Até o momento, são apenas três. “olhar outro” foi o primeiro. “As Coisas: Escolhas” foi o segundo e morreu depois de descansar um tempo na gaveta, como ensinava Drummond, e por fim “Caminhos”. Não sei se haverão mais. Saber qual a lógica que os une não implica que eu saiba de onde eles vêm e que possa ir lá buscá-los. Só desconfio que me são sussurrados pelas mesmas coisas que inspiram este blog.

Posted by Roberto de Pinho in AsCoisas, 3 comments

Ontem, ouvi Stanley Jordan tocar Eleanor Rigby.

Talvez um título meio longo, mas já diz tudo. Não tenho mais palavras.

Por algum motivo, ao longo do show, vinham trechos de um texto, que reconheci mais tarde como sendo de Caetano :

Lembro com muito gosto o modo como ela se referia a ele. Pelo menos ela o fez uma vez e isso ficou marcado muito fundo, dizendo: caetano, venha ver o preto que você gosta. Isso de dizer o preto, sorrindo ternamente como ela o fazia, o fez, tinha, teve, tem, um sabor esquisito, que intensificava o encanto da arte e da personalidade do moço no vídeo.

Era como se se somasse àquilo que eu via e ouvia, uma outra graça, ou como se a confirmação da realidade daquela pessoa, dando-se assim na forma de uma benção, adensasse sua beleza.

Eu sentia a alegria por Gil existir, por ele ser preto, por ele ser ele, e por minha mãe saudar tudo isso de forma tão direta e tão transcendente. Era evidentemente um grande acontecimento a aparição dessa pessoa, e minha mãe festejava comigo a descoberta.” do livro “Verdade Tropical” de Caetano Veloso


Devo ter me identificado com alegria dele existir e a descoberta do que ele fez com a música.

O único ponto negativo do show, aqui em São Carlos, foi a profunda falta de educação de parte da platéia, que não parou de falar o tempo todo.
Posted by Roberto de Pinho in Verso e Prosa, 3 comments

As coisas: olhar outro

Ele passa e olha através do vidro. Sei que me deseja. Nada o impede. Em 5 minutos poderia estar em seus olhos. Em 5 minutos poderia suavizar o mundo para ele. Mas não, ele prefere seguir. Prefere ? O que o amarra ? Por que deixa o sol franzir sua testa ?

Já quase vai, mas me olha. Se me tens, de mim se esquece, me torna satélite do seu ser. Mantido por uma atração invisível. Alguns movimentos se imprimem e ficam e repetem-se mesmo na minha momentânea ausência.

Mas num instante, fujo, num ciúme de outra atenção, num lapso bêbado, numa alegria que o leva a outro lugar, deixada para trás, recuso-me a gritar.

Assim, não mais estaremos juntos. Esta escolha nunca será minha. Se vai nada faço, se volta aceito.

Mas, nesta ausência, ganho importância, pouco se importa comigo, mas como pude escapa-lo, que deficiência sua não o deixou manter domínio sobre a mais inerte das coisas, como deixou fugir quem tem pernas para prender ? Como salvar o mundo se nisto não se conserta ? Como ter outras sabendo que um dia irá também perde-las, a mim, de novo.

Posted by Roberto de Pinho in AsCoisas, Favoritos, Verso e Prosa, 7 comments