Favoritos

:-)

  • ACM SAC 2009: MMV Track paper receives Best Paper Award in the Information System Theme:
    • Incremental Board: A Grid-Based Space for Visualizing Dynamic Data Sets
      Roberto Pinho, Maria Cristina F. Oliveira, Alneu de. A. Lopes, Universidade de São Paulo, Brazil
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No Atlântico




Em algum lugar do Atlântico perdeu-se o meu anjo exterminador.

Indeciso entre o seguir ou o voltar, afogou-se em reflexão e,

em reflexo, no espelho que queria controlar.




O mundo que herdo não é feito de alegrias ou respostas prontas. Nele cabe a tristeza no olhar do menino e cabe o adulto, que parece lhe dizer, seja na mais terna demonstração de fragilidade, seja na mais violenta explosão de quem se encontra encurralado, “dá-me a mão”.

Mas nele cabe também a leveza de saber que não tenho a resposta, e que ela não existe. Neste novo mundo, me somo ao menino que chora e ao adulto que pede colo. Me somo àqueles, que por mais perdidos que estejam, lhe trazem alguma sabedoria e também aos que, em plena certeza, semeiam os desentendimentos. Navego entre a simplicidade que salva e a que engana, entre a complexidade necessária e a sem sentido.


Neste sereno mundo, neste difícil mundo, neste mundo revolto e complexo, estou pronto a abraçar tudo que tenho e carrego, tudo que encontrarei pela frente, toda a grandeza da sua vasta experiência e da sua bela diversidade, que em tanto a mim superam. Nele, as noites são mais iluminadas e o impensado não assusta tanto.


Neste amplo mundo cabe a não trivial possibilidade do andar de bicicleta sob a chuva.

E isto

basta para me

deixar feliz.

Arte de Ananda Nahu

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They are here to save our lives.


“As Harold took a bite of Bavarian sugar cookie, he finally felt as if everything was going to be ok. Sometimes, when we lose ourselves in fear and despair, in routine and constancy, in hopelessness and tragedy, we can thank God for Bavarian sugar cookies. And, fortunately, when there aren’t any cookies, we can still find reassurance in a familiar hand on our skin, or a kind and loving gesture, or subtle encouragement, or a loving embrace, or an offer of comfort, not to mention hospital gurneys and nose plugs, an uneaten Danish, soft-spoken secrets, and Fender Stratocasters, and maybe the occasional piece of fiction. And we must remember that all these things, the nuances, the anomalies, the subtleties, which we assume only accessorize our days, are effective for a much larger and nobler cause. They are here to save our lives. I know the idea seems strange, but I also know that it just so happens to be true. And, so it was, a wristwatch saved Harold Crick.”

-Kay Eiffel, ‘Stranger Than Fiction’
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Certa desventura


Um Dia,

os economistas irão notar,

os sociólogos e antropólogos, observar,

filósofos irão debater,

mas estatísticos irão finalmente confirmar:

O falar português inequivocamente aumenta as chances de [alguém] sofrer a eterna desventura de viver à espera de viver ao lado teu.

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Nina Simone – I Love You Porgy – 1962

Se algum dia você for capaz de me levar a um lugar onde tudo se apresenta possível, em que a felicidade do mundo está ao alcance das mãos, ao mesmo tempo em que uma imensa tristeza, uma tristeza que é saudade de uma perfeição que sempre nos escapa, me abraça e me deixa feliz como aquele que quase dorme e que sente o sol no rosto ao balançar na rede. Se algum dia você me levar a um país de sonhos que sabemos sonhar e que neles andamos, não para resolvê-los mas para segui-los e vivê-los. Se um dia me deixar num estado de tranqüila tensão, neste dia serás Nina Simone.

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Requiem

No dia em que eu morrer, quero que ouçam Portishead

e que aprendam que só na dor há a cura.

No dia em que eu morrer, quero que toda declaração seja previamente escrita e lida por uma outra pessoa

e que aprendam na dor do outro a lidar com a sua própria dor.

No dia em que eu morrer, quero que queimem meu corpo e me espalhem no trajeto da Lancha da Carreira

e que aprendam a me ver entre Mar Grande e Salvador.

Não quero a presença de padre, rabino, monge ou pastor que nunca tenha tomado uma cerveja comigo

Não quero marca nesta terra além daquelas que deixei em vida

Não quero resumo ou epitáfio que limite numa frase aquilo que nem mesmo eu sei dizer quem fui.

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Samsara

Todos os dias tento me reescrever a mim mesmo,
mas como fui escrito à caneta, não há borracha que dê jeito.

Resignado, rabisco em cima de mim todos os meus excessos.

Faço traços e curvas cada vez mais fortes até que não se distingua uma letra sequer.

Inutilizado o papel, digo:

agora, tudo vai ser diferente

Parto para a próxima folha do caderno, marcada profundamente por todos os meus caminhos, sulco fácil por onde escorrer a nova tinta.

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Le Crapaud Noir

o sapo boi que eu engoli ontem está boiando dentro do meu estômago. e a insônia grudou nos meus olhos e deu à minha boca um gosto de febre.
às 10:34 em ponto, ela entrou no escritório, eu sei porque cada tique do relógio reverberava na minha cabeça como um ataque dos exércitos aliados.

susto. acho que ela teve essa impressão minha quando entrou no escritório. pelo menos foi mais ou menos com um pequeno sobressalto felino que ela me percebeu. os olhos dela pararam em mim como de um pequeno mamífero encurralado.

estranho como me lembro nitidamente deste episódio. aquela pequena sala, não lembro a cor das paredes, mas a vibração era de um cinza cimento, cinza concreto. acho que reconstruí a sala na minha mente de acordo com a imagem que faço dela.

não sei, isso é confuso. tenho certeza de que havia um ventilador grande, velho e empoeirado. e que o ventilador estava desligado.

atrás de mim, certamente havia uma janela, que me iluminou à frente dela como se eu fosse uma aparição. isso certamente a impressionou. lembro dela ter fechado a janela ao sairmos.

será que lembro ou construí isso em cima de alguma outra coisa ? naquele dia eu dei um passo dentro de um mundo do qual eu ansiava fazer parte. e do qual, meses depois, me desligaria.

mas que diabos isso tem a ver com o sapo boi que coaxa dentro do meu estômago?

pequena edição sobre trechos de S.i.s.s.i.
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Vagar: 2 anos, em 1999

Vi uma chamada para uma reportagem sobre o caminho de Santiago e fiquei pensando:

O que pode haver em um caminho que o permita transformar as pessoas ?

Quando Colombo deixou o porto de Palos e chegou ao novo mundo, sacramentou a impossibilidade do ser humano ir a qualquer parte por si só.

Ao juntar o mundo, Colombo quebrou a sua continuidade. Definiu Velho e Novo Mundos. Dois em um único planeta. Para atravessar de um mundo a outro eram, e pode-se dizer que ainda são necessárias imensas naus, ou naves, como queiram.

Quando entramos nessas naus, carros, aviões, entre outras, sumimos num ponto e aparecemos em outro sem entender o ser um só, sendo vários. Perdemos parte importante do processo.

Assim, um caminho é capaz de juntar novamento o mundo, torná-lo uno. Mostrar-nos que o mundo de Santo Amaro é o mesmo que o mundo de Conceição da Feira, o mundo do Catete é o mesmo que o mundo de Ipanema, que o mundo de França é o mesmo que o mundo de Espanha.

Este é o valor de Amir Klink remar o oceano. Costurando novamente Velho Mundo e Novo Mundo.

Este é o valor do Vagar, que reconstroi o único meio de transporte não nave, o único meio de transporte que não permite a alienação do caminho, cujo o meio é tão fim quanto a chegada : O Andar.

Mas nem só de meios vivem os fins. Quem Vaga desloca-se ou apenas movimenta-se. E para deslocar-se é necessário movimento e fim.

Originalmente publicado em 07/08/1999 19:06, Aqui.

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