Tem dias que tenho medo da beleza
mas não de uma beleza qualquertenho medo da beleza escrita, cristalizada, pura e perfeita das palavras bem escolhidas
como o menino que fui e sou, fico deitado, protegido nas minhas cobertas fantasiando as mil maneiras de ser devorado pelo monstro que atrás da porta do armario, atrás da capa, após o link
tenho medo da piada mortal, de rir tanto, que em toda minha vida jamais possa encontar tal alegria
tenho medo de achar a canção que faça acordar os homens e adormecer as crianças
tenho medo, sobretudo, de uma canção de amor que vá tocar num disco voador
Posso morrer de inveja e de fragilidade, se, por um acaso, aquilo que está ali traz aquilo que guardo como de mais pessoal, mais único, que me toca mais profundamente. Invejo não ter escrito antes, não ter pensando antes, frágil, invadido, por um alguém desconhecido que me conhece sem nunca ter me visto
Tenho medo de ler Gabo. Genial traidor, nos faz acreditar num outro ritmo, numa Macondo infinita, ao ritmo de ondas sem fim, mas que, ao virar da última página, acabam e nos abandonam, e o dia chegará, que não terei mais nenhum de seus livros, à minha espera, disponíveis, sussurando : em caso de emergência, leia-me
tenho medo de ter que terminar este texto.
Hmmm… fear and desire? BTW, adorei a ilustracao, Pillow Book e um dos meus filmes preferidos.